Ainda e sempre a propósito do ponto de exclamação, lembrei-me de um restaurante vegetariano no coração de um jardim em Lisboa, onde as casas de banho estão assinaladas com um ponto de exclamação para o homem e um ponto de interrogação para a mulher. Talvez sejam os letreiros mais originais que vi até hoje, ou os que mais me deram que pensar. A escolha destes símbolos terá resultado de uma leitura simplista que viu no ponto de exclamação uma forma fálica, e descobriu uma generosa curva feminina no ponto de interrogação? Ou quererá dizer que as mulheres estão sempre a fazer perguntas e os homens a falar com certezas altas? Algo como: ainda gostas de mim? pergunta ela com feminina insegurança. Claro! responde ele de pronto, espalhafatosamente masculino. Ou: já reparaste que trago um vestido preto novo? pergunta ela com uma insinuante coquetterie. Gooollllllllllllooooooooo! grita ele, infantilmente entusiasmado. Outra hipótese: estaria aqui dissimulado o pressuposto de atribuir à mulher uma introspecção entre o filosófico e o poético (onde espelhos, livros, flores, canetas, contas de supermercado e até a lua cabem na mesma mala) e ao homem uma exclamação da ordem do pragmático, dada com o nó da gravata já meio desfeito e os olhos postos na televisão? É claro que há outras sinaléticas, tantas são as formas de identificar o respectivo sexo das casas de banho: um S para ela, um H para ele; a palavra Cavalheiro para os animais humanos masculinos e a palavra Senhoras para os animais humanos femininos; um pincel de barba para os homens (algum se lembrará de fazer a barba ali mesmo, entre umas amêijoas à Bulhão Pato e um bife do lombo com batatas fritas?) e uma caixa de pinturas com rouge e sombras de olhos para as mulheres (elas sim, vão à casa de banho para retocarem conversas e rostos, de preferência antes da sobremesa); um bigode para ele e uns lábios com baton vermelho para ela; um chapéu de coco para ele e um chapéu com plumas para ela; silhuetas dançantes numa festa, como se a entrada na casa de banho correspondesse ao ingresso num salão de baile; cromossomas xx para ela e xy para ele. Na Expo 98 a sinalética feita pelo designer japonês para identificar as casas de banho era tão inteligente quanto minimal: os pictogramas eram rigorosamente iguais, só que um estava virado para cima e o outro para baixo. A mulher tinha uma bola preta a fazer de cabeça com um laçarote em cima, como as meninas das histórias românticas; o homem tinha essa mesma bola preta e idêntico laçarote colocado por baixo, a representar aquele que acompanha o smoking dos gentlemen. Muitos seres tiveram dificuldade em os seguir. Talvez não entendessem como alguém tornara semelhantes a este ponto (e laçarote) homens e mulheres. Também é um ponto negro que une homens e mulheres na metáfora visual utilizada na casa de banho do tal restaurante vegetariano no centro de um jardim em Lisboa: ele é a base da exclamação e da interrogação. Quando lá entrei, foi isso que não pensei, seguindo a interrogação que me estava destinada pela minha condição de representante do sexo feminino. Mas antes, confesso, ainda hesitei por um segundo. Na dúvida, entrei. E não é que acertei? As mulheres são um ponto de interrogação.