A morte obriga-nos a crescer, de repente. Porque para os que continuam vivos, a morte também tem algo de definitivo: temos de aprender a viver de novo. Como se regressássemos à primeira classe e nos pedissem para fingir que não sabemos fazer contas complicadas, falar francês, escrever palavras como "oxímoro" ou "telúrico"e tudo o que fomos aprendendo pelo caminho. A morte pede-nos para fingir. Porque só assim a vida pode continuar suportável. A morte lembra-nos todos os dias que a nossa infância não mais será o que foi. Seja qual for a nossa idade. E ainda nos pede para termos muito cuidado com a palavra "saudades". É que só se podem matar saudades de seres vivos. Os que vivem dentro de nós e são invisíveis para o mundo, habitam, incansáveis, o espaço onde a saudade nunca se poderá sentar. Não fosse ela lembrar-se de começar a ganhar corpo.