sexta-feira, 30 de março de 2012

O livro da ilha


Quando um dia perguntaram a G. K. Chesterton que livro gostaria de ter consigo, se fosse um náufrago numa ilha deserta, o provocador pensador deu uma resposta desarmante, daquelas que por vezes só as crianças sabem dar. A pergunta podia ser embaraçosamente difícil para alguém, como ele, que devorava livros como quem saboreia bolos com creme (se os livros engordassem estava explicado o seu imponente e pesado corpo) e ainda lhes entornava chá em cima das anotações. Havia uma série de respostas imagináveis, como A Bíblia (será que por essa altura já se tinha convertido ao catolicismo*?), A Ilha do Dr. Moreau, do seu amigo H. G. Wells ou um ensaio filosófico de São Tomás de Aquino. Mas Chesterton não raciocinou nem como um erudito nem como um místico e, confiando na lógica, deu a resposta que lhe parecia evidente: um manual de construção de botes. Escolheu um livro, não para se evadir espiritualmente, mas fisicamente da ilha deserta. Deixou-nos imaginar um teórico distraído, não à sombra de uma palmeira lendo um clássico da história da literatura como Robinson Crusoé, D. Quixote ou Moby Dick, mas de mangas arregaçadas a construir o seu meio de fuga. Segurando nas mãos um barco feito de papel, até este se transformar lentamente em madeira e lhe permitir retomar a civilização, de regresso a Inglaterra, a ilha para onde levou todos os seus livros.
* um obrigada ao fiel leitor que detectou o meu erro de cariz religioso, já eliminado