Volta e meia, acontece. E nos últimos tempos, aconteceu a Tonino
Guerra, Ray Bradbury, Antonio Tabucchi e Carlos Fuentes. Quando um escritor morre, as
livrarias apressam-se em arranjar-lhe um pequeno canto onde reunem todas as
edições possíveis e imaginárias da sua obra. Muitas delas, subitamente
resgatadas a um esquecimento que cheira a mofo, vêm de caves e depósitos e
aparecem com roupas (leia-se capas) fora de moda. Apesar dos livros se sentirem
orfãos, tentam não chorar, para não desbotar a voz do seu autor. Logo agora que ele está mais vulnerável é que ficou tão exposto aos olhos do mundo,
com o seu frágil corpo de letras feito. Este velório com caixão aberto, como
lhe chamou uma livreira amiga, tem como pretexto honrar a memória do defunto. Mas enquanto as personagens se vestem
de luto pelo autor, as livrarias esperam vendê-lo mais. Sabem que os vivos dão valor aos mortos.