domingo, 15 de janeiro de 2012

Inquietos humanos


Num mundo cada vez mais dedicado a ignorar a morte (com o culto da juventude, o prolongamento da esperança de vida e a ilusão da imortalidade), Inquietos (Restless), de Gus Van Sant é o filme em que dois adolescentes olham a morte de frente. Ele chama-se Enoch (Henry Hopper) e esteve em coma (e ao que parece morto durante 3 minutos) na sequência do acidente de automóvel que vitimou os seus pais. Tem por amigo o fantasma de um soldado kamikaze morto na 2ª Guerra, com quem atira pedrinhas aos comboios que passam e joga à batalha naval. Ela é Annabel (Mia Wasikowska), apaixonada por Darwin, estuda a natureza (sobretudo os pássaros) e tem apenas três meses de vida, devido a um tumor cerebral em fase terminal. Conhecem-se por acaso num funeral, porque ele tem o hábito de assistir a funerais de estranhos e passam o filme, que começa e acaba numa cerimónia fúnebre, a viver a morte. Ele apresenta-lhes os pais no cemitério, observam cadáveres na morgue, tentando adivinhar como as pessoas morreram, comemoram a noite de Halloweeen, passam dias no hospital e demarcam os seus corpos de mãos dadas a giz no asfalto, simulando a sua morte. Porque é a morte que está na origem de todas as suas (e nossas) inquietações, apesar de como escreveu o fantasma kamikaze na carta de amor amarrotada que traz consigo e que nunca entregou à sua namorada, a morte ser fácil, o amor é que é difícil. E se o cinema sabe eternizar o amor, também promete vencer a morte, esse carimbo que valida, desde que nascemos, a nossa condição de inquietos humanos.