Todos os carteiros deviam jogar às cartas. Não com as cartas de jogar, sempre enfadonhamente iguais (não obstante elas se acharem absolutamente diferentes) e sem vida interior, mas com as cartas que transportam todos os dias consigo, levando palavras a chocalhar e por vezes até um coração a bater com cuidado, para não ganhar muito volume (fora todos os números das cartas dos bancos, da EDP, da Optimus, das finanças, da Epal e do Círculo de Leitores), de um lado para o outro. Teriam de ler e tomar nota de todas as cartas pessoais (aquelas que não tinham números) que entregavam, para quem eram e de quem vinham. Caso essa carta estivesse mais de um mês sem receber resposta, eles próprios a escreveriam, não se sabe bem com que consequências. Podia acontecer que a carta que escrevessem ficasse também ela sem resposta e então, um mês depois, estariam a escrever para si próprios, fingindo não o saber.