sexta-feira, 3 de abril de 2009

Girl Power com sotaque francês

Entretanto, o tempo passou e as lolitas dos anúncios a preto e branco cresceram, mas apenas o suficiente. Em meados da década de 90, são jovens adultas e os anúncios onde surgem ganharam cor. Corto Maltese, numa das suas aventuras pelo mundo, lamentava-se sobre o facto de um homem não poder cair nos braços de uma mulher sem ficar nas suas mãos. Nas mãos das mulheres é como ficam os homens na segunda fase da campanha Kookai. Não sabemos se caíram nos seus braços, mas decerto caíram perante as suas roupas ousadas e sedutoras. Depois da educação e filosofia de vida recebidas, encontramo-las a brincar de forma efectiva com jovens representantes do sexo oposto. De quem fazem gato sapato e trinta por uma linha. Passaram da teoria à prática. Mostram e demonstram o que elas e a roupa Kookai (como já devem ter percebido, trata-se de uma joint venture!) fazem aos homens, a vingarem séculos de subjugação e domínio do chamado sexo forte. Resultado desta inversão cultural e social, o sexo forte encolheu e tem o tamanho de um pequeno objecto. E é assim que os homens nos aparecem: minúsculos, mas com tamanho suficiente para nos apercebermos de que são extremamente bonitos. Aniquilados, ridicularizados e enfraquecidos, não apresentam argumentos. Perderam o corpo e, pior ainda, perderam a razão. Abandonaram o seu estatuto de sujeito e tornaram-se, decididamente, num objecto. No seu novo estatuto, tanto são um pequeno animal de estimação (peixe), como um objecto (piercing) ou modelos à escolha numa máquina de vendas automáticas. Como alternativa a tudo isto, são pequenos escravos que espalham bronzeador pela pele das jovens ou lhes depilam as virilhas, actos indispensáveis para elas usufruírem da praia e dos biquínis Kookai. Até foi criado um pequeno pictograma, que acompanha todos estes anúncios. Representa um homem a ser atingido por um raio, que possivelmente vai direito ao coração. Escravos da sedução, estão enfeitiçados e presos na sua própria teia de desejo. E o mais humilhante é pensar que é preciso tão pouco para reduzir um homem à sua insignificância. Nenhum dos anúncios tem headline, corpo de texto ou sequer assinatura. Palavras para quê? É como se o processo da sedução fosse silencioso, instantâneo e fulminante. E enquanto não for encontrado um antídoto, vai ser sempre assim. Porque estas mulheres (não) são para brincadeiras. Jovens e independentes, mantêm os homens em banho-maria. Se umas vezes lhes dão atenção, é só para reforçar a sua dependência delas. É verdade. Eles dependem da vontade delas. Parecem assustados, mas ninguém os acode. São presas demasiado fáceis. E o que valoriza uma vitória é a força do opositor. Se fosse um combate de boxe, as mulheres venciam por K.O. no 1º assalto, ao fim de 10 segundos. Da roupa, pouco se vê. São decotes, peças de roupa interior, vestidos colantes e tops exíguos. Tudo em nome da sedução. A cor favorece os modelos de roupa reduzidos que elas envergam. São predominantes os azuis, os lilases e os verdes. Elas estão extremamente maquilhadas e não prescindem de pintar as unhas de cores fortes ou de usar sapatos de saltos muito altos. Já não são liceais arrogantes. São universitárias licenciadas em sedução, com 20 valores na matéria. E sabem, melhor do que ninguém, que o segredo é mostrar, mas não mostrar tudo. É como se estas roupas coloridas e justas ganhassem a propriedade de um véu esvoaçante, que brinca com o olhar, num incessante movimento entre mostrar e esconder. Esse é o ritual. Até porque a imaginação de cada um faz o resto. Essa é a armadilha. As mulheres Kookai são perigosas, porque são Evas disfarçadas. Não usam a parra, mas tapam o corpo com pouco mais. Não oferecem a maçã, mas tiram a lucidez. E sabem-se donas do mundo, como o leão se sabe dono da savana, só de olhar para ela. Este é o lado irracional. Mas se formos pela lógica, as coisas não melhoram. Todas as mulheres são escravas da moda. Os homens são escravos das mulheres, logo, podemos concluir: afinal, os homens é que são escravos da moda. Quem diria!

Editado na Pública, em data por confirmar